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Descanso para a alma

22 dez

descanso

“Descansa no Senhor e espera nele…” (Salmo 37:7)

     Vivemos em um mundo cada vez mais conturbado e que exige das pessoas coisas além do que podem oferecer ou fazer.

No mercado de trabalho, os empregadores querem indivíduos que, além de ser bem qualificados, vistam a camisa da empresa e tenham o perfil que se encaixe na filosofia de trabalho adotada pelo patrão. Em outras palavras: que vivam em função da empresa.

Como consequência disso, o indivíduo se vê obrigado a sempre voltar para a escola (não que isso seja ruim; ao contrário, é excelente, desde que na medida certa) ou a fazer cursos que lhes dê condições que propiciem meios para galgar novos cargos ou funções com melhores salários, privilégios, status social ou simplesmente permanecer empregadas.

Se a pessoa está desempregada, o que já causa enormes transtornos, muitas vezes há também a necessidade de retornar à sala de aula ou a cursos de especialização, atualização ou qualificação para que tenha o que se chama de “empregabilidade”.

Na família, também existem pressões e cobranças, seja por parte do cônjuge – que  reivindica mais atenção, carinho, dedicação, cuidados – ou  dos filhos, que cobram o mesmo – aliás,  normalmente são reivindicações justíssimas.

Ademais, a sociedade atual faz exigências totalmente inescrupulosas. A mídia vende a ideia de que se alguém não possui isso ou aquilo, seja na área de serviços, produtos, bens, fama, relacionamentos ou outros não é feliz. Não é um cara bacana, descolado, especialmente se for adolescente ou jovem.

O pior é que não raramente cobranças excessivas ocorrem até mesmo na igreja da qual alguém é membro. É evidente que não estou querendo dizer que quem faz parte de uma comunidade não precisa ter nenhum compromisso ou responsabilidade com ela. Se pensasse assim, estaria indo contra os ensinamentos bíblicos e, consequentemente, agindo como um tolo. Basta olhar para I Coríntios 12, no qual Paulo compara a igreja a um corpo e argumenta que cada membro é fundamental, pois tem uma função singular e insubstituível.

Refiro-me, portanto, aos exageros. E isso porque há cristãos verdadeiramente íntegros e bem intencionados que, para atender os chamados ou convocações da igreja, saem todos os dias de casa, com ou sem a família e, como resultado, não têm tempo para ficarem a sós com seu cônjuge, pais, filhos, familiares… Logo, não têm vida social. Correm, desse modo, o risco de ganhar o mundo para Cristo, mas perder sua família. Ou então viver isolado do mundo, sem amigos.

Como resultado de tantos compromissos e cobranças, mesmo que a pessoa não perceba, sua alma começa a se sentir cansada, oprimida, sobrecarregada, o que fatalmente terá como efeito altos níveis de estresse, angústia, a sensação ou impressão de estar sempre em débito ou abaixo do padrão de qualidade possível ou necessário, podendo resultar numa depressão profunda ou num esgotamento psicofísico, isto é, da mente e do corpo. Por conseguinte, precisará de descanso, de tratamento.

Para entendermos um pouco melhor, viajemos juntos no Salmo 23. Todo ele é assaz importante, mas primeiramente vamos nos ater ao versículo 3, que diz: “Refrigera a minha alma…”. Quando conhecemos pelo menos um pouco da vida de Davi, entendemos com mais clareza algumas das razões por que ele fez essa afirmação. Mas para você que não a conhece, direi em poucas palavras, a fim de que se localize.

Primeiramente, ele era pastor de ovelhas e, como tal, sabia que em determinados momentos era preciso conduzir o rebanho a lugares onde havia água fresca e sombra para que saciasse a sede e se refrigerasse do sol escaldante. Só agindo assim é que poderia manter o rebanho em boas condições para o consumo ou para a venda. Ou mesmo com forças para fugir de predadores.

Em segundo lugar, sofreu sérias perseguições da parte de Saul, rei de Israel, e de inúmeros inimigos que sempre queriam ver o seu fim. Muitos desses eram de povos circunvizinhos, porém havia muitos do seu próprio povo que também desejavam vê-lo humilhado e morto.

Para piorar a situação, cometeu adultério. Como a mulher com quem teve esse caso também era casada e engravidara dessa relação proibida, planejou a morte do marido dela e deu ordens para que ele fosse posto na linha de frente de uma terrível batalha para que morresse. Logo, embora não tenha matado Urias com as próprias mãos, por ter sido o mentor intelectual do crime, tornou-se culpado de tais transgressões diante de Deus e dos homens.

Mesmo tendo sido extremamente humilde diante do Senhor e justamente por isso ter sido totalmente perdoado, teve de conviver com a consciência pesada, com as terríveis insinuações e provocações de muitos e com todas as consequências de seu pecado. Até alguns de seus filhos não o respeitavam mais, alguns traíram sua confiança e Absalão quis de qualquer modo tomar-lhe o trono. Para que isso não ocorresse de fato, precisou haver confronto físico e seu filho acabou morto. Mais uma tristeza sobre seus ombros.

Ora, diante de um quadro tão complexo, é compreensível que a alma dele precisasse tanto de refrigério. E foi isso que aconteceu. Ele sabia que Deus, como seu pastor que era, levá-lo-ia a águas tranquilas (versículo 2) e daria refrigério à sua alma, isto é, consolo, alívio, bem-estar. E realmente isso ocorria. Davi saía da presença do Pai renovado, restaurado, fortalecido. Por essa razão, pode declarar seguramente que nada lhe faltaria, que o Senhor o fazia deitar em pastos verdejantes e o guiava a águas tranquilas, que ainda que andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, que a vara e o cajado de Deus o consolavam… (versículos 2 e 4). Enfim: em Deus ele encontrava o descanso de que sua alma tanto precisava.

Creio ser por esse motivo também que o Mestre dos mestres, profundo conhecedor da alma humana, nos disse: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos – ou sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve” (Mateus 11:28-30).

Mais uma vez vale a pena parar uns instantes para refletir sobre grandes verdades reveladas pelo Senhor nesse texto. Aliás, realmente pérolas valiosíssimas, como sempre.

A primeira é que Jesus convida a ir até Ele. Por quê? Porque respeita o direito de escolha de cada um. ( Apocalipse 3:20 – “Eis que estou à porta e bato…”)

Fazendo uso desse direito, há quem decida procurar descanso para sua alma nas drogas, sejam elas ilícitas ou lícitas (Não quero, porém, me opor ao uso de medicamentos indicados pelos médicos terrenos; ao contrário, creio que eles são capacitados pela Ciência e por Deus para nos socorrer. O que quero dizer é que não podemos e não devemos excluir o Senhor, que é o médico dos médicos, do tratamento.), outros há que procuram nos esportes, na música, no lazer, no sexo, nas jogatinas, na aquisição de bens de consumo. Existem até mesmo aqueles que recorrem ao crime ou ao suicídio objetivando encontrar esse bálsamo. No entanto, tais elementos de fuga ou são meros paliativos ou de nada valem para o indivíduo.

Outra observação importante é que o Mestre, conhecedor da nossa estrutura (física, espiritual, psicológica, emocional…) e de que somos pó, ou seja, limitados, falíveis (Salmo 103:14) reconhece que estamos sujeitos aos sentimentos de cansaço, de opressão e de sobrecarga. Por isso, faz uma promessa: aliviar-nos.

Quanta verdade há nisso! Quantas vezes, encontrando-me assim, recorri a ele lembrando-o de sua promessa e pedindo-lhe que me socorresse e realmente encontrei-o de braços abertos a me esperar e disposto a me ajudar! Quão maravilhoso é poder encontrar Nele esse Amigo, esse Médico, esse Príncipe da Paz!

Que bom é saber que Ele não disse isso apenas para criar falsas expectativas, mas que de fato se importa conosco e cumpre o que prometeu! (Números 23:19; Hebreus 2:17 e 18; 4:14 ao 16)

Mais um registro importante é que Ele nos propõe tomar o seu jugo, pois é suave e o seu fardo, que é leve. Contrastando, assim, com o do mundo, que é repleto de pressões, frustrações, decepções, cobranças indevidas ou além do que podemos suportar, que é extremamente pesado e nos faz ficar prostrados pelo caminho muitas vezes ao longo da nossa vida.

Outra verdade é que diz que precisamos aprender com Ele, que é manso é humilde de coração. Não ser manso é ser bravo, o que fatalmente gera inúmeras complicações tanto para o indivíduo quanto àqueles com os quais convive, e destruição de relacionamentos importantes, inclusive com Deus.

Também é preciso ser humilde, conforme mencionado acima. Logicamente, há muitas definições, interpretações e aplicações para a palavra humildade. Entretanto, gostaria de me ater a um deles: Jesus, mesmo sendo Deus, por também estar vivendo de forma humana, reconhecia a necessidade de se afastar para descansar; por essa razão, há diversos   trechos narrando que Ele ia sozinho para lugares desertos ou só com os discípulos, a fim de descansar ou de falar com Deus. Ou seja: tinha a humildade de reconhecer que precisava de descanso para seu físico, já que estava em constante movimento e atendendo muitíssimas pessoas (o que sem dúvida traz um esgotamento das energias físicas). E também para sua alma, uma vez que, além de já ser demasiadamente estressante trabalhar com pessoas, enfrentava perseguições e oposições humanas e, sobretudo, malignas, visto que o adversário sabia muito bem qual era o ministério dele: retirar as pessoas das garras dele e reconduzi-las de volta a Deus, dando-lhes vida abundante aqui na terra e a salvação eterna.

Antes de prosseguir, considero ser importante colocar um dos provérbios de Salomão, o qual diz: “A soberba precede a ruína, e a altivez de espírito precede a queda” (Provérbios 16:18).

Entendo ser relevante ainda mencionar que também podemos contar com o Espírito Santo que, segundo afirmam as Escrituras Sagradas, é o nosso Consolador. Sobre isso, veja o que declara o pastor e conselheiro cristão David A. Seamands em seu precioso livro Cura para os traumas emocionais  (Ed. Betânia):

“Cristo é o nosso Médico ferido; ele compreende bem nosso sofrimento. Por isso, quando se preparava para deixar este mundo, prometeu que não deixaria seus amigos sós, mas voltaria para eles enviando-lhes o Consolador, o Parakletos (grego – Ver João 14:16 ao 18). O termo ‘para’ significa ‘ao lado’ , e ‘Kaleo’ significa ‘chamar’. ‘Eu vos enviarei uma Pessoa a quem vocês poderão invocar, que virá para estar ao lado de vocês e os ajudará em suas fraquezas’.

Vejamos a palavra grega que dá o termo ‘ajudar’. Ele consiste da junção de três vocábulos: ‘sun’ – ao lado de, com; ‘anti’ – no lado oposto -; ‘lambano’ – agarrar, segurar. Quando reunimos todos eles, temos ‘sunantilambanotai’, que significa ‘segurar juntamente conosco a outra ponta’. Você vibrou com essa palavra grega? Pois devia, quando pensasse nesta. ‘Eu lhes enviarei o Parakletos, o Espírito Santo, que vem ficar ao seu lado quando o chamarem, e que irá segurar, juntamente com vocês, o outro lado do fardo.”    

A conclusão a que chegamos, portanto, é que não estamos sós neste mundo tão complicado. Temos alguém com quem podemos contar sempre não apenas para nos aconselhar, oferecer um ombro amigo, chorar conosco ou algo semelhante. Temos o Espírito Santo, que é Deus onipotente e onipresente, e que justamente por isso pode e quer nos dar o alívio da nossa carga e o descanso para nossa alma. No entanto, precisamos ter a humildade para reconhecer nossa limitação e necessidade dele e que precisamos ir até  ele, pois o Senhor não quer agir contra nossa vontade, já que é um cavalheiro e respeita nosso direito de escolher se queremos ou não a ajuda que tem a nos oferecer. Contudo é preciso que saibamos que ninguém que vai até ele volta de mãos vazias.

 

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