“Porém o Senhor disse a Samuel: Não atentes para a sua aparência, nem para a altura da sua estatura, porque o tenho rejeitado; porque o Senhor não vê como vê o homem. Pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para o coração.” (1 Samuel 16:7)
Uma das coisas mais admiráveis em Deus é o seu modus operandi, ou seja, seu modo de operar ou agir. A razão pela qual penso assim é que seu jeito de fazer as coisas ou suas escolhas geralmente caminham na contramão daquilo que vemos no mundo. Isso, às vezes, deixa meio confusos aqueles que não têm intimidade com ele. Mas devo confessar uma coisa a você: até quem anda com ele nem sempre consegue entender alguns de seus métodos.
Outro dia, eu estava lendo para minha esposa mais um capítulo do livro Sabedoria para vencer, do escritor Mike Murdock (Muito bom, por sinal!). De repente, algo que ele escreveu me fez lembrar a história de duas pessoas: Gideão e Davi. E, conversando com ela, veio-me ao coração a vontade de compartilhar com você algumas reflexões sobre os improváveis para o mundo, os quais se tornam prováveis para Deus.
Quando lemos o capítulo 6 do livro de Juízes, vemos que o povo de Israel havia se desviado dos caminhos do Senhor e, em consequência disso, estava sendo oprimido pelos midianitas e amalequitas – 6:1-6. Estes privavam os israelitas de suas colheitas, apossavam-se dos seus rebanhos, e os estava deixando na miséria.
No entanto, havia um remanescente fiel, isto é, pessoas que não se corromperam, que não se envolveram com as práticas pecaminosas do mundo, que não beberam do seu vinho, não comeram dos seus manjares contaminados, nem se prostraram diante dos seus deuses. E esse, pelo que se infere pelo contexto, era o caso de Gideão. Além disso, o texto bíblico também diz “então, os filhos de Israel clamaram ao Senhor” – 6:6b.
O Senhor ouviu o clamor deles e, como é misericordioso, decidiu livrá-los mais uma vez (Juízes 6:7-10), assim como acontecera quando seu povo estava sendo escravizado no Egito e clamara por socorro. Para isso, evidentemente, quis envolver pessoas, as quais precisariam de um líder. Afinal, aquilo que o ser humano pode fazer, o Eterno não faz; apenas capacita aquele que ele escolheu.
Geralmente, quem é escolhido para liderar? Pense numa empresa que se preza. São pessoas fortes, experientes, aptas e habilidosas, que já provaram seu valor e sua competência para exercer tal função. Todavia, o conceito de valor de Deus parece ser bem diferente do nosso.
Certo dia, estava Gideão malhando trigo no lagar para o salvar dos midianitas. Para início de conversa, lagar é o lugar adequado para espremer uvas, não para fazer esse serviço. Isso significa que esse homem bolou uma estratégia interessante para não ser surpreendido pelos inimigos e, assim, suprir as necessidades da sua família – 6:11.
Enquanto fazia o serviço, ainda que não tivesse percebido, estava sendo observado pelo Anjo do Senhor, que se aproximou dele e disse: “O Senhor é contigo, varão valoroso” – 6:12. “Mas Gideão lhe respondeu: Ai, senhor meu, se o Senhor é conosco, por que tudo isto nos sobreveio? E que é feito de todas as suas maravilhas que nossos pais nos contaram, dizendo: Não nos fez o Senhor subir do Egito? Porém, agora, o Senhor nos desamparou e nos deu na mão dos midianitas” – 6:13.
Pela resposta, percebemos que ele não havia compreendido que o mal que lhes sobreviera era consequência da desobediência do povo ou as circunstâncias adversas o fizeram ter dúvidas, como ocorreu com João Batista em relação a Jesus (Mateus 11:2-11).
Com muitas pessoas também acontece algo semelhante. Elas têm dificuldade de entender que, muitas vezes, os sofrimentos pelos quais passam é efeito de ações, escolhas e comportamentos errados. Por exemplo: se nos alimentamos mal ou temos uma vida sedentária, por certo teremos problemas de saúde. Se agimos de forma impensada, podemos gerar atritos com o cônjuge, filhos, amigos colegas de trabalho ou quaisquer pessoas.
Mas o que quero frisar, ou seja, destacar nessa história é a maneira como nós nos vemos e o jeito que Deus nos vê, pois, em muitas ocasiões ou situações, são bem diferentes. Note que, a seguir, o Anjo do Senhor olha para ele e diz: “Vai nesta tua força e livrarás a Israel da mão dos midianitas; porventura, não te enviei eu?” – 6:14.
Ao observá-lo, o Anjo do Senhor viu valor nele. Notou qualidades ou características que não temos condições de identificar com precisão. Nem ele próprio conseguia enxergá-las. Provavelmente, Deus enxergou fidelidade, insatisfação com a opressão e a vergonha em que viviam, vontade de mudar, espírito de liderança, resiliência e/ou outras tão importantes quanto às mencionadas.
Por não ter essa percepção de si mesmo, Gideão passa a apresentar justificativas ou razões para mostrar que não era apto para a missão que lhe estava sendo dada. Veja: “E ele lhe disse: Ai, Senhor meu, com que livrarei a Israel? Eis que a minha família é a mais pobre em Manassés, e eu, o menor na casa de meu pai” – 6:15.
Olhando friamente, parece que esse homem tinha razão de pensar dessa maneira. Primeiro, precisamos lembrar que Israel estava enfraquecido militarmente. Segundo, ao que indica ele não era um guerreiro. Porém, mesmo que fosse, as circunstâncias agora eram totalmente adversas. Logo, havia motivo para pensar desse jeito. Em terceiro lugar, sua família era a mais pobre da tribo de Manassés. Em quarto, e para piorar, ele era o menor da casa do pai dele.
Essa realidade familiar e pessoal o levou a desenvolver um grande complexo de inferioridade. Assim, considerava-se totalmente inapto para fazer aquilo para o que estava sendo chamado. Todavia, mesmo se considerando incapaz, aos olhos de Deus, que a tudo vê de forma integral, Gideão era a pessoa certa para livrar os israelitas daquela terrível opressão que, fatalmente, os levaria à ruína total.
A seguir, Deus lhe disse: “Porquanto eu hei de ser contigo, tu ferirás os midianitas como se fossem um só homem” – Juízes 6:16. Aqui estava o motivo do sucesso desse homem: O Senhor estaria com ele. Gideão não lutaria sozinho. Além dos homens que estariam ao seu lado (Um grande exército formado por 300 homens!!! – Juízes 7:7), o General Invicto promoveria uma das mais extraordinárias vitórias que o povo de Israel já havia presenciado.
Como um bom representante de todos nós, Gideão queria uma prova de que de fato aquela palavra era verdadeira e provinha do Senhor. Então fez a prova do novelo de lã duas vezes – Juízes 6:36 ao 40. E Deus lhe respondeu conforme a solicitação feita.
Dessa maneira, Gideão, que era um improvável, que tinha tudo para ser um fracassado e ser destruído junto com seu povo, tornou-se um líder respeitado, um sucesso, porque Deus enxergou valor nele.
Apesar de as Escrituras não dizerem claramente, penso que muitos duvidaram da sua competência e debocharam dele. Talvez para boa parte dos israelitas ele se tornara motivo de chacota. Contudo, para o Altíssimo, não. O Senhor acreditava nele. E isso fez e faz toda a diferença. E ainda faz toda a diferença!
Mas esse homem não foi o único improvável. Há muitos outros cujos nomes estão na Bíblia. Veja alguns deles:
– Abraão e Sara: Eram de família idólatra (Josué 24:2), Sara era estéril e ambos já estavam numa fase da vida em que gerar filhos passara a ser um sonho distante. No entanto, o Senhor apareceu a ele e ordenou que saísse da casa do pai dele, fosse para uma terra que lhe mostraria e prometeu abençoá-lo, engrandecer o nome dele e torná-lo pai de uma grande nação – Gênesis 12:1-3. E foi justamente o que aconteceu. Ipsis litteris, isto é, tal como está escrito.
– Jacó: não era o primogênito. Logo, não tinha naturalmente o direito à bênção da primogenitura. Todavia, Deus o escolheu, pois viu que ele era diferente de Esaú, o qual era profano e fornicário – Hebreus 12:16.
– Jefté: era filho de Gileade com uma prostituta, ou seja, um bastardo. Por isso, foi rejeitado pelos irmãos e expulso por eles. Apesar de todas as adversidades, tornou-se um homem valente e guerreiro valoroso – Juízes 11:1.
Como Israel estava sendo oprimido pelos Amonitas, os líderes dos israelitas imploraram pela ajuda de Jefté – Juízes 11 e 12. Assim, esse homem começou a escrever sua nova história, agora como um dos juízes mais proeminentes do povo judeu. E mais: seu nome também faz parte da Galeria dos Heróis da Fé – Hebreus 11:32.
– Raabe: além de não pertencer ao povo judeu, era uma prostituta. Logo, sua ficha era bem suja. Contudo, pelo que podemos inferir da história dela, quando ouviu falar do Deus de Israel e seus portentosos milagres, reconheceu-o como seu Senhor e recebeu essa menção na Galeria dos Heróis da Fé: “Pela fé, Raabe, a meretriz, não pereceu com os incrédulos, acolhendo em paz os espias” – Hebreus 11:31.
– Rute: não era judia, mas, por seu temor a Deus, tornou-se bisavó de Davi.
– Davi: era o mais novo de Jessé. Portanto, humanamente falando, não seria o escolhido para ser rei de Israel. Além disso, não era da linhagem real. Até Samuel, que era um homem de Deus, se surpreendeu quando o Senhor o escolheu.
Assim, apesar da improbabilidade, tornou-se o rei mais importante do Povo de Deus. Entretanto, não foi perfeito. Aliás, sua biografia mostra uma grande nódoa em sua vida: cometeu adultério e foi o mentor intelectual da morte de Urias, marido de Bate-Seba, com quem pecara. Porém, por ter se arrependido de verdade, recebeu o perdão divino e ainda foi chamado de “um homem segundo o coração de Deus” – Atos 13:22. Além do mais, o Senhor honrou sua memória, permitindo que da descendência dele nascesse Jesus Cristo, o qual é chamado de Filho de Davi. E o nome de Davi também está na Galeria dos Heróis da Fé – Hebreus 11: 32.
O que dizer, então, do ex endemoninhado gadareno que se tornou um missionário entre seus conterrâneos, sendo enviado pelo próprio Cristo – Lucas 8:26-39?
E a mulher samaritana, a qual tinha uma vida reprovável, mas, após seu encontro com Jesus, foi transformada e também falou aos samaritanos sobre o Messias, levando muitos deles a reconhecerem Jesus como o Cristo – João 4:1-30? E quanto a Pedro? Ele havia declarado que se fosse preciso morreria com o Senhor. Todavia, pouco tempo depois, negou conhecer o Mestre não uma, mas três vezes e até praguejou, tentando despistar quem lhe apontava o dedo – Lucas 22:54-62. E quanto a Paulo de Tarso? O perseguidor de cristãos, que se tornou o grande evangelista de gentios e o maior escritor do Novo Testamento.
Por certo, aos olhos da maioria de nós, as pessoas já citadas e tantas outras cujas histórias trazem manchas e cicatrizes jamais poderiam ser consideradas mulheres ou homens de Deus. No entanto, o Senhor não nos vê nem nos trata como nossos pares. Ele vê infinitamente além daquilo que está diante dos nossos olhos. Por isso, se nos arrependermos e permitirmos que Ele nos transforme e forje em nós o caráter dele, o Eterno perdoa nossos pecados (por mais terríveis que tenham sido – Provérbios 28:13; 1 João 1:9) , regenera nosso coração, permite que o Espírito Santo venha morar em nós, transforma nossa vergonha em dupla honra, nossas lágrimas de tristeza em alegria e nos dá a chance de escrever uma nova e vitoriosa história em parceria com ele.
Além dessas pessoas mencionadas, há muitas outras, sobre quem o escritor da Epístola aos Hebreus declara: “E que mais direi? Faltar-me-ia o tempo contando de Gideão, e de Baraque, e de Sansão, e de Jefté, e de Davi, e de Samuel, e dos profetas, os quais, pela fé, venceram reinos, praticaram a justiça, alcançaram promessas, fecharam as bocas dos leões, apagaram a força do fogo, escaparam do fio da espada, da fraqueza tiraram forças, na batalha se esforçaram, puseram em fugida os exércitos dos estranhos. As mulheres receberam, pela ressurreição, os seus mortos; uns foram torturados, não aceitando o seu livramento, para alcançarem uma melhor ressurreição; e outros experimentaram escárnios e açoites, e até cadeias e prisões. Foram apedrejados, serrados, tentados, mortos a fio de espada; andaram vestidos de peles de ovelhas e de cabras, desamparados, aflitos e maltratados (homens dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos e montes, e pelas covas e cavernas da terra.” – Hebreus 11:32 ao 39.
Mas tenho uma coisa para lhe falar: através dos séculos, há muitos heróis e heroínas da fé, os quais desconhecemos completamente, uma vez que suas histórias não foram registradas ou não chegaram até nós. Entretanto, o Eterno conhece cada um destes pelo nome – 2 Timóteo 2:19, são reconhecidos no céu e, certamente, tem reservado para eles um grande e avultado galardão – Hebreus 10:35.
Também não poderia deixar de dizer algo assaz importante: Quem sabe, por causa dos erros que você cometeu durante uma fase da sua jornada, muitas pessoas (até da própria família ou comunidade) não o consideram como alguém digno. Talvez, nem mesmo você se considera. Mas você não está sozinho.
Como já foi dito, bastantes homens e mulheres cometeram erros graves; porém, seu arrependimento e conversão sinceros tocaram o coração de Deus, o qual os perdoou e os transformou em pessoas dignas, honradas, respeitáveis e respeitadas. E, acredito, VOCÊ é ou pode ser um destes heróis da fé.
Quem sabe, seu problema não seja o cometimento de erros graves, mas uma visão completamente negativa de si mesmo, um grande complexo de inferioridade a ponto de presumir que não possui nenhum valor ou habilidade. Se for esse o seu caso, tenho boas-novas: como imagem e semelhança de Deus (Gênesis 1:26), você é dotado de inteligência e habilidades muito mais do que pode imaginar.
Todavia, se pensar que ainda é pouco, siga o conselho do sábio Salomão: “Filho meu, se aceitares as minhas palavras e esconderes contigo os meus mandamentos, para fazeres atento à sabedoria o teu ouvido, e para inclinares o teu coração ao entendimento, e, se clamares por entendimento, e por inteligência alçares a tua voz, se como a prata a buscares e como a tesouros escondidos a procurares, então, entenderás o temor do Senhor e acharás o conhecimento de Deus. Porque o Senhor dá a sabedoria, e da sua boca vem o conhecimento e o entendimento” – Provérbios 2:1-6.
Portanto, lembre-se de que, enquanto muitos são mestres em criar rótulos, como “ladrão”, “adúltero ou adúltera”, “bêbado”, “drogado”, “mentiroso”, “assassino”, “incapaz” ou o “caso perdido”, por exemplo, Deus é especialista em resgatar e regenerar aqueles que estavam perdidos e transformar improváveis em prováveis.
Como diz o texto de abertura, o Eterno não vê do mesmo jeito que o ser humano, isto é, somente a aparência. Ele conhece profundamente o coração. E mais do que isso: o Pai os transforma em filhos amados, segundo o coração dele, que lhe dão prazer. Em sal, luz e bom perfume de Cristo, cuja fragrância nos atraiu e nos atrai a cada novo raiar do sol. Então, traga sempre à sua memória o que disse o salmista Davi: “Provai e vede que o Senhor é bom; bem-aventurado o homem que nele confia” – Salmos 34:8 – e “Chegai-vos a Deus, e ele se chegará a vós” – Tiago 4:8a. Também não se esqueça de que pode pedir que o Espírito Santo ajude você a vencer suas fraquezas e limitações – Romanos 8:26.








